No Dia Nacional do Samba, a orla de Copacabana amanheceu com um motivo extra para celebrar. No Posto 2, o quiosque Samba Social Clube inaugurou as estátuas de Carlinhos de Jesus e Neguinho da Beija-Flor, dois nomes cuja trajetória se confunde com a própria história do mais brasileiro dos ritmos. A cena chamou o olhar de quem passava pelo local: turistas parando a caminhada, artistas se abraçando, imprensa registrando e uma curiosidade coletiva que parecia crescer a cada minuto.
Texto e fotos: Angélica Cabral
A programação começou por volta das 12h30, com a banda Samba Social Clube e a cantora Marcelle Motta abrindo os trabalhos. A feijoada das 13h atraiu ainda mais gente: famílias, trabalhadores da orla, fãs e até quem só passeava pelo calçadão e decidiu ficar ao ouvir o batuque. Quando a bateria da Beija-Flor chegou, trazendo aquele impacto sonoro que a escola de Nilópolis costuma provocar, o evento ganhou ainda mais corpo. Pouco depois, o grupo Samba do Mancha comandou o fim da tarde, mantendo o clima de roda de samba à beira-mar.
As esculturas, assinadas por Francisco Pará, foram reveladas entre aplausos e celulares erguidos. Carlinhos, em postura que remete à dança; Neguinho, em gesto típico de quem domina o canto. As duas figuras, lado a lado, ajudam a contar uma história que não cabe apenas na avenida: a de um samba que se reinventa e continua moldando a identidade cultural do Rio. Não tem como passar por ali agora e não reconhecer essas duas formas diferentes de traduzir a mesma paixão. É um lembrete cotidiano de que a cultura popular é feita de pessoas reais, que pisam, cantam e criam. E que, às vezes, também merecem virar bronze.
Presente na cerimônia e visivelmente emocionado, Carlinhos de Jesus reforçou o peso da homenagem em um momento de retomada pessoal. Disse que ver sua imagem eternizada na orla, diante de tanta gente, tem um significado especial. Neguinho da Beija-Flor, por sua vez, agradeceu com o humor e a leveza que o caracterizam, lembrando que o samba faz parte do seu cotidiano “como o gosto da comida de casa”.
Para o sócio e operador do quiosque Samba Social Clube, Bruno de Paula, a iniciativa não é apenas um reconhecimento pontual. A ideia é transformar o trecho da orla em um corredor de memória do samba, somando-se a outras esculturas já presentes no calçadão e aproximando moradores e visitantes de figuras essenciais da cultura brasileira. O quiosque, que já funciona como ponto de encontro para rodas, lançamentos musicais e encontros informais de sambistas, ganha agora um marco visual permanente. E, para isso, “os dois ícones são certeiros demais. São duas lendas que merecem ser celebradas, numa data tão simbólica para a nossa cultura”.
A escolha dos homenageados fala por si. Carlinhos de Jesus virou referência nacional na dança de salão, samba de gafieira e nas comissões de frente do carnaval, contribuindo para uma estética que marcou época. É também idealizador do bloco “Dois Pra Lá, Dois Pra Cá”, que por anos ocupou as ruas com alegria, música e muita folia. Além disso, é apresentador do Samba Social Clube, programa de rádio, transmitido pela Rádio Tupi. Neguinho da Beija-Flor, dono de uma das vozes mais inconfundíveis do país, foi por décadas o intérprete oficial da escola de Nilópolis, dando vida a sambas-enredo que ficaram imortalizados na memória afetiva de todo carioca que é bom da cabeça e não é doente do pé.
Ao final do dia, enquanto o sol caía atrás dos prédios de Copacabana, as duas esculturas já haviam se tornado ponto de parada. Gente tocando o bronze, tirando fotos, observando os detalhes. O samba, mais uma vez, ocupava seu espaço na rua, um espaço democrático, acessível, presente. E a orla, que sempre foi cenário de encontros, agora também guarda, em tamanho natural, dois de seus grandes protagonistas.
Vai lá: Quiosque Samba Social Clube - Posto 02 (Avenida Atlântica), em frente à Praça do Lido.