MOSTRAR BARRA LATERAL
CAPA | HÉLIO OITICICA

Penetrável, Livro de cartas, turnê mundial da Cosmococa e outros eventos mostram o quanto ainda se pode saborear Hélio Oiticica, 43 anos após sua morte

Por: Leonardo Lichote

Em 8 de novembro de 1968, numa carta a Lygia Clark, Hélio Oiticica escreveu: “Outra coisa louca que vi ontem: a rainha Elizabeth, da Inglaterra, passou a poucos metros de mim, na rua, num enorme carrão Rolls-Royce, pintada feito uma vedete ou miss: batom carmim, a cara branca carnuda, pareceu-me sabe o que, a grande bicheira desfilando de carrão, como se estivesse dizendo: ‘eu é que sou a boa, ouviu, seus merdas’, pois a malandragem dela é bem como a de um bicheiro: viver bem, ser admirado, e diante deles todo mundo é otário. Fiquei gostando da rainha: é como a miss, a vedete, etc. Velhas corocas, crianças, mães, todo mundo corria loucamente, excitadíssimas para ver a supermãe, ‘a mulher’, que passava. Verdadeira loucura coletiva.

O pessoal da Mangueira desfilou para ela na Embaixada, e devem ter-se sentido realizadíssimos, pois se vestem todo ano de nobres, mesmo de reis e rainhas, e de repente aparece ‘a rainha’, imagine só que análise grupal genial! Isso é que é bacana hoje: a rainha, Chacrinha, Elizabeth Taylor, todo mundo é a mesma coisa, como se num gigantesco teatro onde tudo acontece: o consumo-teatro ou a própria geleia geral (atenção: este termo foi criado pelo Décio Pignatari, e é muito bom, não acha?)”.


Carnaval, cultura pop, bicheiros, rainhas… O trecho revela de maneira sintética um tanto dos elementos que se fundiam na fornalha criativa que era a cabeça do artista morto em 1980. A carta é uma das quase 80 reunidas no livro “Hélio Oiticica: cartas 1962-1970” (Editora UFRJ), que lança luz sobre os bastidores da vida e da arte de Oiticica — duas instâncias que para ele se misturavam de maneira indissociável...

 

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